quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Abdias do Nascimento

                        

Deputado, senador, escritor, poeta, dramaturgo, professor emérito e Doutor Honoris Causa em várias universidades no Brasil e no exterior, Abdias tem também um relevante trabalho como artista plástico e sua obra compõe um rico tesouro de referências sobre a ancestralidade africana, abrangendo a luta dos negros escravizados por liberdade, cidadania e direitos humanos.

Sua arte se insere numa visão mais ampla do desenvolvimento milenar da civilização africana em todo o mundo, pois abarca a história do africano como autor de saberes eruditos e criador de uma estética de profundo impacto e significado.
                                        
Reconhecido internacionalmente como uma das mais importantes personalidades brasileiras do século XX, Abdias Nascimento tem se dedicado à missão de recuperar a dignidade humana do povo negro e à defesa de uma identidade ideológica baseada na experiência histórica dos povos africanos e das diásporas nas Américas, Caribe e Pacífico.
Neto de africanos escravizados, filho de pai sapateiro e mãe doceira, Abdias Nascimento nasceu em 1914 na cidade de Franca (SP) e, desde criança, aprendeu com sua mãe que nunca deveria deixar sem resposta uma ofensa racial.
"Vinte e seis anos separam  a abolição da escravidão do nascimento de Abdias. Seus pais, porém, não haviam sido escravos, diferentemente de sua avó materna.
Isso demonstra que as feridas oriundas do mundo escravista ainda se encontravam abertas e podiam ser sentidas".(Macedo, 2005)
Em um trecho do trabalho cientifico " o pensamento social e político na obra de Abdias do Nascimento"de André Luis Pereira, é possível ler "[...] Na verdade a carreira militar descortinou para Abdias a primeira percepção de como funcionavam as relações raciais no Brasil. Ele percebeu que existia um racismo camuflado, velado entre a ridicularização de tudo aquilo que o negro produzia e a tolerância paternalista para com os negros engajados no serviço militar. O tratamento diferenciado entre negros e brancos no exército, apenas refletia o funcionamento da sociedade brasileira".
Entre julho e setembro de 1932, Abdias combateu na Revolução Constitucionalista de 1932, no Batalhão do general Euclides Figueiredo, atuando como cabo pelo lado de São Paulo. Durante a batalha, ficou a par da existência da Legião Negra, nome dado aos Batalhões compostos somente por negros e que atuaram nos conflitos de 1932, em São Paulo.
A Legião era formada por indivíduos que desligaram da Frente Negra Brasileira (FNB), pelo fato da entidade se posicionar de maneira neutra  em relação ao movimento revolucionário".
Abdias do Nascimento se engajou na Frente Negra Brasileira, que foi um importante movimento, iniciado em São Paulo em 1931, que tinha como principio o enfrentamento das atitudes racistas produzidas pela sociedade, para assim, alcançar a igualdade social. A "Frente", como era chamada pelos associados é considerada a primeira organização política e racial dos negros brasileiros (Guimarães, 1999,2002.2003; Butler, 1998. Andrews, 1991; Santos, 1985. Mitchel, 1077).

Educado em instituições e circulando onde sua condição racial era sempre evidenciada, o jovem negro aos poucos foi construído sua consciência racial, um processo que poderíamos denominar de  "tornar-se negro".( Macedo, 2005).

É possível inferir que em função da experiência pessoal com a realidade brasileira, Abdias, além da capacidade de abstrair teoricamente as nuances que desfavorecem os negros brasileiros, sabe da real condição enfrentada pelos negros, exatamente por ter vivido a mesma condição, e não apenas teorizado sobre elas.

Por ter sofrido duas prisões, uma em 1937, por criticar a ditadura Vargas, e distribuir panfletos que criticavam a implementação do Regime do Estado Novo, e a outra em 1944, por insubordinação no Exército e por ter se envolvido em uma confusão em um bar que causou sua exoneração na instituição.
Levado para a Penitenciária de Carandiru, onde passou dois anos, fundou o Teatro do Sentenciado, organizando um grupo de presos que dirigiam e interpretavam suas próprias criações dramáticas.
Assim, o  período de encarceramento é marcado por experiências como ator e diretor teatral.
Ao sair da prisão, no inicio de 1944, Nascimento estava decidido a implementar a idéia de fundar um teatro negro.
Logo foi criada uma das mais expressivas contribuições ao cenário artístico, social e político brasileiro, o Teatro Experimental do Negro (TEN).  O T.E.N foi mais muito mais do que um grupo teatral composto só por negros. Alem da parte artística - com varias peças centradas na temática racial - organizou concursos de beleza e artes plásticas, promoveu intensa atuação política-social através de convenções, conferencias, congressos, seminários, cursos de alfabetização e iniciação artístico-cultural para negros, editou um jornal intitulado Quilombo e alguns livros.(Macedo, 2005)      
                                               
"Nasceu em 1944, no rio de janeiro, o Teatro Experimental do Negro, ou T.E.N que se propunha a resgatar, no Brasil os valores de pessoa humana e da cultura negro-africana, degradados e negados por uma sociedade dominante que, desde o tempo da colônia, portava a bagagem mental de sua formação metropolitana européia, imbuída de conceitos pseudocientificos sobre a inferioridade da raça negra.
                                            

Propunha-se o T.E.N a trabalhar pela valorização social do negro no Brasil, através da educação, da cultura e da arte. O T.E.N visava estabelecer o teatro, espelho e resumo da peripécia da existência humana, como o fórum de idéias, debates propostas, e ação visando à transformação das estruturas de dominação, opressão e exploração raciais implícitas na sociedade brasileira dominante, nos campos de sua cultura, economia, educação, política, meios de comunicação, justiça, administração publica, empresas articulares, vida social, e assim por diante.
Um teatro que ajudasse a construir um Brasil melhor, efetivamente justo e democrático, onde todas as raças e culturas fossem respeitadas em suas diferenças, mas iguais em direitos e oportunidades."
(Nascimento, Abdias do, Teatro Experimental do Negro: trajetória e reflexões, ESTUDOS AVANÇOS 18 (50) 2004, pág 209-224 )
  Entre seus inúmeros feitos, o Teatro Experimental do Negro organizou o I Congresso do Negro Brasileiro em 1950 e transformou-se em uma iniciativa revolucionária, que buscava fazer com que os negros não continuassem representando para a diversão dos brancos, e sim afirmassem a sua verdadeira história, fortalecendo os valores da cultura tradicional africana.
Em 1968, em plena ditadura militar, Abdias fundou o Museu de Arte Negra com obras doadas por

                                                    

artistas comprometidos com a luta contra o racismo, mas sentindo a pressão de vários inquéritos policiais militares (IPMs), em novembro de 1968, deixou o país às vésperas do Ato Institucional nº 5 (AI5). Ministrou aulas, palestras e conferências em várias universidades norte-americanas e européias, sempre denunciando as práticas de racismo no Brasil.

No ano de 1977, participou do II Festival Mundial de Artes e Culturas Negras e Africanas, realizado em Lagos (Nigéria), e propôs que o encontro adotasse como recomendação ao governo brasileiro o ensino compulsório da história e da cultura da África em todos os níveis da educação: elementar, secundário e superior.
De volta do exílio, Abdias estava no histórico 7 de julho de 1978, quando, perante três mil pessoas, foi lançado, nas escadarias do Teatro Municipal de São Paulo, o Movimento Negro Unificado
Contra a Discriminação Racial (MNUCDR), com um manifesto que afirmava: "O MNUCDR foi criado para ser um instrumento de luta da comunidade negra".
Um adendo
Os conceitos pseudocienticos referidos pelo autor são oriundos, da cultura cientifica européia que a partir das idéias de classificação propostas por Carl von Lineu, criaram um padrão de referência, onde o modelo de exemplo, era a cultura do próprio classificador, que era colocada em uma posição superior ao objeto da observação, fato que gera distorções óbvias, quando trata de culturas exógenas, como mostrado no trecho que traduzo abaixo e que os motivos alegados para a infeiroridade dos povos terem sidos inseridos via "saber cientifico", inculcou nas sociedades européias o pensamento racista que perdura até os dias atuais e que alguns manifestam sem conhecer a verdadeira origem, ou seja, apenas reproduzem de forma irracional o  nefasto legado, e outros ainda manifestam-se por razões ideológicas, crendo na estupidez da eugenia.
Talvez, suscite no exposto acima, uma noção de ser um pensamento anacrônico, mas basta procurar na mídia, tanto televisiva quanto impressa e constatar que não há rostos negros como protagonistas de temas ou propagandas importantes, salvo em algumas raras exceções, encontra-se um ali outro acolá, isto em um país com mais da metade de sua população afro descendente.
Alguns temas estão atualmente sendo postos em evidência e cito a novela Vitória da rede Record, que expõe a temática de maneira crua e de forma explícita, sem a maquiagem de novela de época sobre a escravidão com suas colocações tolerantes e harmoniosas, diria até românticas, que fazem apologia ao mito do congraçamento das raças e tornam menos atual a situação do racismo, com isso desviando o foco da questão.
E também, observo que chega-se ao cúmulo de levar visitantes estrangeiros para visitar favelas, para terem contato, ou poderem ver pessoas não brancas, pois de outra forma, por força do  "status" que estão, somente veriam pessoas iguais, e teriam a errônea impressão que o Brasil é um pais predominantemente branco.
No livro penser le racisme de Michel Girod, pág.35-40 é narrado : "Le but de ce chapitre n'est pás de faire um inventaire de propôs et discours racistes tenus par les scientifiques, mais de montrer, à partir d'exemples suffisamment nombreux pour être significatifs, combien et comment les hommes de science, em particulier les naturalistes, ont été influencies pour las courants de pensée, voire les idéologies de leur époque et ont influencé à leur tour, certains peu, d'autres beaucoup, l'opinion de leurs congénères et des générations suivantes. Le nazisme, point culminant du racisme en Europe, apparaît non pas comme un cataclysme sans signes précurseurs, mais comme l'héritage d'une pensée raciste forgée et véhiculée pendant de décennies par des "savants"  et autre intelectuels bien pensants.
Depuis la fin de la Seconde Guerre mondiale, les dérapages sont encore fréquents, même s'ils prennent parfois une forme plus insidieuse.
Le "siècle des Lumières".. et des ombres
Ce que caractérise, nous dit-on, le "siécle dês Lumiéres" es le triomphe d la raison. Certes, la volonté encyclopédique de décrire  et d'analyser le monde de manière rationelle est l'un des traits du XVIII siècle, mais, em réalité, les croyances irrationnelles des siècles précédents n'ont os disparu. Elles ont seulement reçu une légitimité fondée sur ce que l'on pensait être le raisonnement et l'argumentation scientifique. " Avant le XVIII, note Christian Delacampagne (2000, p.142) , nous avions des rascismes formulés dans la langage du myte, à partir du XVIII siècle, nous avons um racisme qui prétend parler celui  de la science". 
Le XVIII siècle est l'époque où naturalistes nomment, classent, trient, hiérachisent les organismes vivants; c'est l'époque des classifications, de ce que l'on appele en biologie la taxionomie. Le pére de cette discipline est le grand naturaliste suedois Carl von Linné (1707 - 1778). Preocupe par l'ordre que preside à la diversité du vivant, Linné ést attaché á classer les espèces. Concernant l´homme, il a défini six races, quatre correspondent aux quatre continent (européen, américain, asiatique, africain ) dont les capacites intellectuelles et morales sont supposées aller em décroissant; les deux autres correspondent aux "sauvages" et aux "dégénérés". Qu´il s´agisse de l´homme ou des autres espèces vivantes, Linné considérait que c`etaient des créations divines, immuables et permanentes.
Á la même époque, em France, vivait le comte de Buffon (1717 - 1788), mathématicien et, lui aussi, excellent observateur de la nature. Membre de l´a Academie des sciences à vint-six ans, il est l´auteur d´une Homme Naturelle, ouvrage colossal de trente-six volumes dont um chapitre est consecré à la "dégénération des animaux". Dans cet ouvrage, Buffon émit une hypothése intérresante, mais étrange pour comteporain. Selon lui, un groupe humain pourrait subir des changements dans sés traits originaux, em particuler la couleur de la peau, si d´aventure il migrait dans une région caractérisée pour une autre climat. Pour vérifier la pertinece de cette hypothése, il suggère de "transporter quelques individus de cette race noir du Sénégal au Denemark où l´homme a communément la peau blanche, les chevaux blonds, les yeux bleus...". Il serait nécessaire, ajoute-t-il, de "cloîtrer ces Negrés avec leur famille et conserver soigneusement leur race, sans leur permettre de la croiser: ce moyen est le seul pour savoir combien il faudrait de temps pour réintégrer la nature de l´homme et, par le même raison, combien il en a fallu pour changer du blanc au Noir". Il ne fault pás oublier qu´á l´époque de Buffon, l´escravage battait son plein. C´est évidemment por cette raison qu´il n´a  pas envisagé de transporter au Sénegal quelques spécimens danois pour déterminer le temps nécessaire à l´acquisition d´une peau noire! . Em soutenant ailleurs que "le negré est à l´homme ce que l´âne est au cheval", il est évident que Buffon ne fait que donner aux préjuges de son époque um habillage pseudoscientifique. Il n´en rest pas  mois vrai que, jouant d´une réputation dans les milieux intellectuels, ses idées ne sont pas restées cantonneés dans le cercle restreint des savants. Intendant du Jardin du Roi, cet ami de Voltaire et de Mme Pompadour fréquentait plusieurs salons parisiens prestigieux. 
Dans le dernier  quart du XVIII siècle, quelques rares savants commencèrant à réaliser que l´homme porrait être ètudie de la même façon que le autres animaux, et qu´il serait instructif de definir et de comparer les caractères anatomiques des uns et des autres. Cette  période marque le début de ce que l´on appelle l´anthropologie physique. Johann Friedrich Blumenbach (1752 - 1840) fut l´un de pères de cette nouvelle discipline. Tout en partegeant les idées de Linné sur l´origine des espèces, il voit dans le cinq races qu´il a mettre en évidence une communauté d´origine. La race "caucasienne" (pour lui, la plus élégante et la plus harmonieuse) serait la race humaine originelle à partir de laquelle les autres ("americaine","africaine", "mongolienne", et "malaise") auraient divérge par dégénérescence (G. Friedrickson, 2003, p.65).
Emmanuel Kant (1724 - 1804), le fameux auteur de la Critique de la raison pure, a écrit, lui aussi, à la fin de sa vie (1788) une Anthropologie dans laquelle il situe les Noirs  au bas  de l´échelle humaine, qualifie les Juifs d´usuriers et d´escrocs, et soutient que les femmes doivent occuper dans la sociéte une position subordonné à celle l´homme. (Il est utile de noter ici que racisme et discrimination sexuelle ont des points communs et que Kant, s´il est un précurser, nést pas le seul à mettre la femme en bas de l´échelle de l´évolution humaine!) 
Dans un livré déja cité, Christian Delacampagne soutient à juste titre que ce sont " les préjugés racistes, assortis de justifications pseudo-biologiques, qui dominent la scène intellectuelle tout u long du siècle des Lumières et qui continueront à dominer le siècle suivant". Il ajoute: "L´idée selon laquelle il y aurait des races supérieures (la race blanche ou la race claire) et  des races inférieures (les races de couleur ou races foncées) présdestinées par leur contitution physique à obéir aux précédentes est déjà, au tornant du XVIII et du XIX siècle, une idée trés ancrée dans l´esprit d´un grand nombre de savants et philosophes européens [....]. Au fil des années, cette idée sortira du cercle étroit des érudits pour se diffuser gans l´opinion publique".(Ch. Delacampagne, 2000, p 153-154).
Rare sont les savants et intellectuels du XVIII siécle qui exprimèrent des opinions plus lucides et altruistes. Parmi ceux-ci, il faut citer avant tout Condorcet(1743 - 1794) dont la carrière politique fut tout aussi remarquable que la destinée scientifique. Mathématicien déjà célèbre à vint-cinq ans, secrétaire perpétuel de l´Academie de sciences á trente deux ans, il est également um homme passioné de justice. Philosophe engangé, luttant contre toutes les formes d`obscurantisme, parlant avec ferveur de l´igalité et de l´fraternité, il prend clairement position contre le traites dês Noirs et l´esclavage, mais il faudra attendre encore soixante-dix ans (1848) pour que ce dernier soit oficiellement aboli em France.
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A tradução
O objetivo desse capitulo não é fazer um inventário das propostas e discursos racistas tidos por científicos, mas de mostrar, a partir de exemplos suficientemente numerosos por serem significantes, quanto e como os homens da ciência, em particular os naturalistas, foram influenciados pelas correntes de pensamento, através das ideologias de suas épocas e influenciarão por seu turno, certos medos, de outros em demasia, a opinião de seus congêneres, e das gerações seguintes.
O nazismo, ponto culminante do racismo na Europa, apareceu não como um cataclísma sem sinais precursores, mas sim como uma herança do pensamento racista forjado e veiculado durante os decênios pelos "sábios", e outros intelectuais bem pensantes.
Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, as escorregadas são ainda freqüentes, mesmo quando elas apresentam por vezes uma forma mais insidiosa
O "século das Luzes"....e das sombras".
Por suas características, nos diremos, "o século das luzes" é o triunfo da razão. Certos, a vontade enciclopédica de descrever e de analisar o mundo de maneira racional foi um dos traços do século 18, mas, na realidade, as cenças irracionais dos séculos precedentes não desapareceram.
Eles foram somente recebidos como um legítimo fundamento sobre o que pensaram ser a racionalização e a argumentação cientifica. "Antes do século 18, nota Christian Delacampgne (2000, p.142), nos teremos o racismo formulado pela linguagem do mito, à partir do século 18, nos teremos um racismo que pretende falar dele mesmo pela ciência".
O século 18 é a época omde os naturalistas nomeavam, classificavam, escolhiam, hierarquizavam os organismos vivos; é esta a época das classificações, a qual chamamos de biologia e taxionomia. O pai dessa disciplina é o grande naturalista sueco Carl Von Linné (1707 - 1778). Preocupado com ordem que preside a diversidade dos seres viventes, Linné se propôs a classificar as espécies. Concernente ao homem, ele definiu seis raças, quatro correspondendo aos quatro continentes (europeu, americano, asiático, africano) de onde as capacidades intelectuais e morais são por suposição indo em direção a um decaimento; os dois outros correspondem aos "selvagens" e aos "degenerados".
No posicionamento do homem e as outras espécies viventes, Linné considerava que eles eram creações divinas, imutáveis e permanentes.
Na mesma época, na França, vivia o conde de Buffon (1717 - 1788), matemático e também um excelente observador da natureza. Membro da Academia das Ciências aos vinte anos, ele o autor

                                                    

do Homme Naturelle, obra colossal de trinta e seis volumes onde um capitulo é consagrado a "degeneração dos animais".
Nesta obra Buffon emite uma hipótese interessante, mas estranha para os contemporâneos. Segundo ele, um grupo humano poderá subir das mudanças de seus traços originais, em particular da cor da pele, se aventurar de imigrar de uma região de clima característico
para outra de outro clima.. Para verificar a pertinência dessa hipótese, ele sugeriu de " transportar quaisquer indivíduos de certa raça negra do Senegal para a Dinamarca onde os homens são comumente de pele branca, os cabelos loiros, e os olhos azuis....". E será necessário, acrescentou ele, de "internar estes negros com uma família e conservar rigorosamente a sua raça, sem permitir
cruzamentos; por este meio se poderá saber quanto tempo é preciso para reintegrar a natureza do homem e, pela mesma razão, quanto ele demora para trocar do branco ao Negro". Não se pode esquecer que na época de Buffon, a escravidão estava no apogeu. E evidentemente por esta razão que ele não pode viabilizar o transporte para o Senegal quaisquer especimens dinamarquês para determinar o tempo necessário para a aquisição da pele negra!
E assim afirmando que "o negro está para o homem assim como o asno está para o cavalo", está evidente que Buffon não faz mais que dar aos preconceitos de sua época uma roupagem pseudocientifica. E não é menos verdade que, gozando de uma reputação de um dos melhores intelectuais, suas idéias não ficam restritas aos círculos dos pensadores. Freqüentador do Jardim do rei, este amigo de Madame Pompador freqüentador de muitos salões parienses prestigiosos.

No último quarto do século 18, alguns raros pensadores começaram a idealizar que o homem poderia ser estudado da mesma forma que os outros animais, e que isso seria instrutivo o ato de definir e de comparar as características anatômicas de um e do outro. Este período marcou o começo daquilo que se chamou a antropologia física Johann Friedrich Blumenbach (1752 – 1840) foi on dos pais desta nova disciplina. Tudo em parceria com as idéias de Lineu sobre a origem das espécies, e com a visão das cinco raças ele colocou em evidência uma comunidade de origem.
A raça “caucasiana” (por ele, a mais elegante e a mais harmoniosa) seria a raça humana original a da qual as outras (“americana”, “africana”, “ mongolíca”, e “malaia”) teriam divergido para a degenerescência. (G. Friedrickson, 2003, p.65).

Emmanuel Kant (1724 - 1804), o famoso autor da Critica da Razão Pura, escreveu, ele também, no fim de sua vida (1788) uma Antropologia na qual ele situa os Negros em baixo da escala humana, qualificando os Judeus de usurários e escroques, e afirmando que as mulheres deveriam ocupar na sociedade uma posição subordinada aquela dos homens.(é útil aqui que o racismo e discriminação sexual são os pontos comuns e que Kant, torna-se o precursor, não só colocando a mulher embaixo da escala da evolução humana!)
Em um livro já citado, Christian Delacampagne afirmou em um justo titulo  que é “ Os preconceitos racistas, arranjo de justificativas pseudo-biologicas, que dominam a cena intelectual toda ao longo do século das Luzes e que continuarão a dominar no século século seguinte”. Ele acrescenta “ A idéia segundo aquela que existe, raças superiores (a raça branca  ou a raça clara) e das raças inferiores (as raças de outras cores ou mais escuras) predistinadas por sua constituição física  a obedecer aos precedentes dela, ao redor do século 18 e do 19, uma idéia muito fixada no espírito de um grande número de pensadores e filósofos europeus [...] Ao longo destes anos, essa idéia sairá do circulo estreito dos eruditos para se difundir na opinião pública.”. (Ch. Delacampagne, 2000, p 153-154).
Raros são os pensadores e intelectuais do século 18 que se exprimirão por opiniões mais lúcidas e altruistas. Entre eles, é preciso citar antes de tudo Condorcet(1743 – 1794) do qual a carreira política foi também tão notável quanto a científica. Matemático já celebre aos vinte e cinco anos, secretário perpétuo da Academia de Ciências aos trinta e dois anos, ele era igualmente um homem apaixonado pela justiça. Filosofo enganjado, lutando contra todas as formas de obscurantismo, falando com fervor de igualdade e de fraternidade, ele toma claramente posição contra os tratos dos Negros e a escravidão, mas foi preciso esperar ainda setenta anos (1848) para que finalmente fosse oficialmente abolida na França.

Com o exposto acima, não quero denegrir os pareceres cientificos lúcidos, e progressistas à favor da humanidade, mas fica claro que mentes supostamente esclarecidas, podem causar danos que somete muito tempo depois poderão talvez, ser reparados caso, assim se proceda, certamente.
Para os afrodescendentes adiciono o seguinte trecho [...] as vozes ancestrais sempre brotam de nossos porões, daquilo que trancafiamos sem nos darmos conta do que fazemos, ao negligenciarmos a ancestralidade que vive através de nós mesmos.
Daí a dificuldade em lidarmos com as questões concretas e pragmáticas da vida cotidiana.
É preciso ouvir as vozes que ecoam. E elas sempre ecoam de dentro. Por isso também a sugestiva atualização no jongo recopilado pela saudosa Clementina de Jesus em que se afirma na corruptela de sangoma como cangoma na herança moçambicana: “Tava drumindo... Cangoma me chamou. Disse: Levanta povo, cativeiro já acabou!” (FERREIRA SANTOS, 2002).

As vozes ancestrais adormecem em nosso inconsciente... estamos sempre “drumindo”... até que as vozes ancestrais nos chamem. Inflama-se, então, a chama ancestral que ilumina nosso ser no mundo. Daí também o receio de ouvir e afastar tudo que possa nos aproximar de nós mesmos.
Este medo é o que nos leva a “calcar o sonho, matar a viagem ainda no ovo da fantasia” (COUTO, 2003: 66).

Para todos os que sofrem ações preconceituosas e que por vezes não entendem por que tal fato ocorre, espero ter ajudado no caminho dessa difícil compreensão, mostrando tanto o bushido (caminho do guerreiro) de Abdias do Nascimento, exemplo e motivo de orgulho para os afro descendentes e aos desprovidos de  preconceitos, e também, as razões que baseadas em um psedo-saber cientifico que de forma subliminar, ainda move mentes e corações pelo Brasil e no mundo.

E como os Areaes eternos sentissem fome e sentissem sede de flagelar,
devorando com as suas mil boccas tórridas todas as rosas
da Maldição e do Esquecimento infinito, lembraram-se,
então, symbolicamente, da África!
(Cruz e Souza, 1924)1
(...)
Ó bocca em chammas, bocca em chammas,
Da mais sinistra e negra voz,
Que clamas, clamas, clamas, clamas
N’um cataclismo estranho, atroz (...)
Resume todos esses travos
Que a terra fazem languescer.
De mãos e pés arranca os cravos
Das cruzes mil de cada Ser.
A terra é mãe! – mas ébria e louca
Tem gérmens bons e gérmens vis...
Bemdita seja a negra bocca
Que tão malditas cousas diz!
(Cruz e Souza, 1923)

1 Cruz e Souza, Dor Negra. In: Evocações. Obras Completas de Cruz e Souza, vol. II, Prosa. Rio de Janeiro:
Annuario do Brasil, 1924, p.228 (obs.: conservada a forma ortográfica dos originais).
2 Cruz e Souza, Canção Negra. In: Pharóes. Obras Completas de Cruz e Souza, vol. I, Poesia. Rio de Janeiro:
Annuario do Brasil, 1923, p.257 (obs.: conservada a forma ortográfica dos originais).



                         

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Teoria do Caos e Fractais - Chaos et Fractus -


          

"Talvez a matemática seja eficiente ao representar a linguagem subjacente ao cérebro
humano. Talvez os únicos padrões de que nos apercebemos sejam matemáticos, por ela
ser o instrumento da nossa percepção. Talvez seja eficiente a organizar a existência
física porque é inspirada por existência física. Talvez não existam padrões reais, mas
apenas aqueles que nós, de espírito fraco, impomos".
                                                                                                 Eugene Wigner

Chaos et Fractus
Teoria do Caos
A teoria das estruturas dissipativas, também conhecida como teioria do caos, tem como principal representante o químico belga Ilya Priogine, e afirma que o mundo não segue estritamente um modelo de relógio, ou seja, previsível e determinado, e sim, que tem aspectos caóticos.
Alguns cientistas, principalmente o matemático, físico e filósofo francês Jules Henri Poincaré (1854-1912), começaram a perceber que a dificuldade de resolução apresentada por certos sistemas dinâmicos não estava limitada à quantidade de técnicas até então existentes, mas havia limitações intrínsecas, diante das quais se podia demonstrar, por exemplo, que certos sistemas sequer admitem solução analítica, não são "integráveis". O estudo desses sistemas só pode ser realizado impondo-se condições particulares ou por soluções numéricas, na época, ainda sem a ajuda dos computadores, muito trabalhosas. É o caso do sistema envolvendo três corpos que se atraem através da força gravitacional - um problema de mecânica celeste que, no caso de dois corpos, foi tão bem resolvido por Newton.
Poincaré enfocou esse problema no seu famoso ensaio de 1890 Sur le Probléme des Trois Corps et les Équations de la Dynamique e na sua coleção de três volumes Méthodes Nouvelles de la Mécanique Céleste, produzida entre os anos de 1892 e 1899.
Ele provou que o problema de três corpos de forma geral não é integrável, pois não existem "integrais adicionais" para resolver o sistema (DRESDEN, 1992b).
Somente alguns casos particulares são integráveis. Poincaré, então, desenvolveu novos métodos qualitativos de análise matemática que deram origem à "topologia".
Uma outra característica presente no problema de três corpos, para certos parâmetros, viria a perturbar definitivamente a confiança na predição: a sensibilidade apresentada em relação às condições iniciais. Essa sensibilidade levou Poincaré a refletir sobre a possibilidade do conhecimento exato da situação inicial e as conseqüências sobre o comportamento final.
Ele observou em Science et Méthode, de 1908:
 "Uma causa muito pequena, que nos passa despercebida, determina um efeito considerável que não podemos deixar de ver, e então dizemos que o efeito é devido ao acaso. Se conhecêssemos exatamente as leis da natureza e a situação do universo no momento inicial, poderíamos prever exatamente a situação desse mesmo universo no momento seguinte. 
Contudo, mesmo que as leis naturais já não tivessem segredos para nós, ainda assim poderíamos conhecer a situação aproximadamente. Se isso nos permitisse prever a situação seguinte com a mesma aproximação, seria tudo o que precisaríamos, e diríamos que o fenômeno tinha sido previsto, que é governado por leis. 
Mas nem sempre é assim; pode acontecer que pequenas diferenças nas condições iniciais produzam diferenças muito grandes nos fenômenos finais. Um pequeno erro nas primeiras produzirá um erro enorme nas últimas.  A previsão torna-se impossível."

Suas observações estavam bem próximas da caracterização do comportamento caótico. Algumas ferramentas hoje utilizadas no estudo dos sistemas dinâmicos, em particular no comportamento caótico, foram criadas ou tiveram seu embrião nos trabalhos de Poincaré. Uma dessas ferramentas, que permite analisar sistemas dinâmicos tridimensionais com métodos análogos aos utilizados num plano, observando o comportamento de uma trajetória em sua vizinhança, é o
                                                                            
  "mapa de Poincaré".
Outra ferramenta, desenvolvida mais profundamente pelo físico e matemático russo Aleksandr Mikhailovich Lyapunov (1857-1918) e a escola de Gorki (hoje Nizhny Novgorod, na Rússia), surgiu de uma nova conceituação de estabilidade: soluções estáveis eram distinguidas de soluções instáveis por um "coeficiente característico", hoje conhecido como "expoente de Lyapunov".
O expoente de Lyapunov mede a velocidade de divergência - ou de convergência - de duas trajetórias vizinhas no espaço de fase.
Ildeu de Castro Moreira (1992 e 1993) acrescenta que James Clerk Maxwell (1831-1879), vinte anos antes de Poincaré, já havia advertido à comunidade científica da época sobre a impossibilidade de previsões precisas mesmo em sistemas de poucas partículas. Maxwell não só percebeu esta característica nos sistemas físicos como arriscou-se a tecer considerações filosóficas sobre o livre-arbítrio e as limitações do determinismo.
David Ruelle alinha ao trabalho de Poincaré outros dois cientistas franceses que contribuíram na percepção da sensibilidade às condições iniciais: Jacques Hadamard (1865-1963) e Pierre Duhem (1861-1916).
Num livro para o grande público editado em 1906, Duhem intitulou um parágrafo: "Exemplo de dedução matemática para sempre inutilizável". Como ele explica, essa dedução matemática é o cálculo de uma trajetória sobre o bilhar de Hadamard.
Ela é "para sempre inutilizável" porque uma pequena incerteza, necessariamente presente na condição inicial, dá lugar a uma grande incerteza sobre a trajetória calculada se esperarmos por um tempo suficientemente longo, e isso torna sem valor a predição. (RUELLE, 1991:66)
 Hadamard, Duhem e Poincaré perceberam a existência desses sistemas dinâmicos não-lineares com sensibilidade às condições iniciais, porém essa descoberta não repercutiu imediatamente sobre a comunidade científica.
Ruelle discute duas razões que considera terem sido responsáveis pelo enorme atraso na repercussão das idéias de Poincaré e subentende uma terceira razão: a inexistência dos computadores.
Para o intervalo surpreendente que separa Poincaré e os estudos modernos do caos, podemos citar a descoberta da mecânica quântica, que revolucionou o mundo da física e ocupou todas as energias de várias gerações de físicos. ...
Na Mecânica Quântica a descrição de fenômenos microscópicos passava a ter uma descrição de caráter essencialmente probabilístico.
Há também, uma outra razão para o esquecimento em que caíram as idéias de Hadamard, Duhem e Poincaré: elas vieram muito cedo, não existiam ainda os meios de explorá-las... É preciso notar também que, quando não conseguimos tratar matematicamente um problema, sempre podemos estudá-lo numericamente pelo computador.
Mas este método, que desempenhou um papel essencial no estudo do caos, evidentemente não existia no início do século XX. (RUELLE, 1991:68)
Na realidade, apesar de freqüentemente revisitados, até recentemente os trabalhos de Poincaré não foram mobilizados de maneira integrada.
O sucesso dos sistemas dinâmicos lineares, com solução analítica, concentrou a atenção de várias gerações de cientistas. Stewart comenta, com certa dose de ironia, como vinham sendo tratados alguns problemas envolvendo equações não-lineares.
Na época clássica, à falta de técnicas para fazer face a não-linearidades, o processo de linearização foi levado a extremos que muitas vezes tinham lugar enquanto as equações estavam sendo formuladas, por exemplo: a equação clássica do calor é linear, antes mesmo que se tente resolvê-la.
                                                \frac{\partial u}{\partial t}=\eta\Delta u + f(x)\,
                                                    Equação do calor  (fonte wikipédia)
Acontece, que o fluxo de calor real não o é, e segundo pelo menos um especialista, Clifford Truesdell, por maior que tenha sido o bem que fez para a matemática, a equação clássica do calor só causou prejuízo à física do calor. (STEWART, 1989:92)
Embora tenha sido percebido desde a época de Poincaré, o comportamento caótico em sistemas não-lineares só foi reconhecido, enquanto tal, no início dos anos de 1960.
Desta forma, a Teoria do Caos pode ser considerada como a teoria que deu origem ao estudo de objetos e formas complexas, até então não estudadas e que eram consideradas desorganizadas, mas que na verdade possuíam seqüências de detalhes em comum.
Conforme Secco e Rocha (2004) a Teoria do Caos pode ser vista como um universo com sistemas, ou um conjunto de objetos que inter-relacionam, extremamente sensíveis às condições iniciais, uma simples alteração poderá levar a uma mudança no resultado.
Sistemas caóticos são indeterminísticos, ou seja, seus resultados não são possíveis de serem previstos e seu comportamento não é periódico.
Entre os sistemas consideram-se duas categorias: lineares e não-lineares, que divergem entre si na sua relação de causa e efeito.
Na primeira, a resposta a um distúrbio é diretamente proporcional à intensidade deste.
Já na segunda, a resposta não é necessariamente proporcional à intensidade do distúrbio, e é esta a categoria de sistemas que serve de objeto à teoria do caos, mais conhecidos como sistemas dinâmicos não-lineares.
Esta teoria estuda o comportamento aleatório e imprevisível dos sistemas, mostrando uma faceta onde podem ocorrer irregularidades na uniformidade da natureza como um todo. Isto ocorre a partir de pequenas alterações que aparentemente nada têm a ver com o evento futuro, alterando toda uma previsão física dita precisa.
Uma das idéias centrais desta teoria, é que os comportamentos casuais (aleatórios) também são governados por leis e que estas podem predizer dois resultados para uma entrada de dados.
O primeiro é uma resposta ordenada e lisa e cujo futuro dos eventos ocorre dentro de margens estatísticas de erros previsíveis.
O segundo é uma resposta também ordenada, onde porém a resultante futura dos eventos é corrugada, onde a superfície é áspera, caótica, ou seja, ocorre uma contradição neste ponto onde é previsível que os resultados de um determinado sistema será caótico.
Segundo Batanete e Castro (2004) a teoria do Caos não é uma teoria de desordem, mas busca, no aparente acaso, uma ordem intrínseca determinada por leis precisas. Além do clima, outros processos aparentemente causais apresentam certa ordem, como crescimento populacional e a flutuação do mercado financeiro.
O meteorologista Lorenz, que estudava a variação do clima a longo prazo, foi o primeiro a perceber que pequenas variações em uma situação inicial podem causar imensas deturpações a longo prazo, exemplificando a sua descoberta com a famosa metáfora "[...] o bater de asas de uma borboleta pode causar um tufão do outro lado do mundo.[...]" (apud Gleick 1990), conhecida como a metáfora do efeito borboleta.
A metáfora da borboleta que provoca um tornado nasceu em uma palestra apresentada por Lorenz no 139° Encontro da Associação Americana para o Avanço da Ciência, em Washington, D.C, em 29 de dezembro de 1972, intitulada Predictability: Does the Flap of a Butterfly's Wings in Brazil set off a Tornado in Texas?
(Previsibilidade: A Batida das Asas de uma Borboleta no Brasil provoca um Tornado no Texas?), publicada pelo autor em seu livro The Essence of Chaos. A escolha do Brasil e do Texas se deve ao efeito sonoro das combinações de palavras (butterfly-Brazil, tornado-Texas) e ao fato de estarem localizados em hemisférios diferentes, o que dificulta a análise do efeito do bater das asas (LORENZ, 1995).
O autor não responde à questão que levanta, mas a borboleta viria a se transformar num símbolo de sensibilidade às condições iniciais. O sucesso dessa metáfora se deve também à aparência de borboleta na representação do atrator de Lorenz e à grande repercussão do livro de James Gleick, onde o "Efeito Borboleta" aparece como título do  primeiro capítulo (HILBORN,2004).

Atrator

O atrator pode ser definido como o comportamento que um sistema dinâmico que independentemente do ponto de partida, tem a tendência para convergir para um ponto (atrator).
Um exemplo clássico que pode ser utilizado para a descrição de um atrator, é uma bola rolando sobre um plano. Devido ao efeito do atrito o movimento da bola tenderá a convergir sempre para uma situação cuja velocidade é nula. Este é o atrator, o movimento zero.
Outro exemplo de atrator é um pêndulo em movimento. O seu balanço, sempre tenderá a convergir para uma oscilação cujo período é constante, isto é, o atrator, é o período constante.
                                                                                                           
                                        

                                                      Atrator estranho de Lorenz
Ao observarmos os resultados dos estados das Equações de Lorenz e os representarmos num gráfico tridimensional, observaremos que haverá uma convergência em direção a um atrator tridimensional.
A figura resultante terá um padrão que não corresponderá nem à órbitas, nem à imobilizações, isto é, o resultado obtido, pode ser considerado diferente do que se esperaria de um atrator, ou seja o resultado que poderá ser considerado estranho.
Logo, no caso acima o sistema em questão não assumirá jamais duas vezes o mesmo estado. Haverá sim uma região onde existirão mais pontos, formando até padrões, mas a figura e seus pontos serão caóticos. Este sistema caótico é considerado imprevisível, porém ocorre o fato estranho: ao mesmo tempo que o sistema é caótico, paradoxalmente converge para um atrator determinado. A concepção destas idéias, ganhou força com o uso de computadores.
Os atratores estranhos geram figuras com "dimensão fracionária", conhecidas como Fractais. Através do cálculo dessa dimensão pode-se inferir algumas características do comportamento caótico. Para se ter uma idéia de dimensão fracionária imagina-se uma linha de comprimento infinito, composta de pequenos segmentos com orientações diferentes, que pode ser vista como uma linha muito rugosa. Esta linha rugosa teria uma dimensão entre um e dois.
Uma propriedade típica dos Fractais é a auto-similaridade, ou invariância na mudança de escala:
                                     
durante a evolução do fractal formam-se figuras similares em diferentes dimensões.
A relação entre o comportamento caótico e a dimensão fracionária do atrator estranho contribuiu para se estabelecer uma estreita, porém equivocada, ligação entre o Caos e os Fractais: embora também tenha extensões na teoria dos sistemas dinâmicos não-lineares (diversas figuras fractais são geradas por sistemas de equações não-lineares), a história dos Fractais e suas aplicações se desenvolveu de forma totalmente independente da história do Caos.
A grande maioria dos fractais não tem ligação com o comportamento caótico.

Fractais
A origem dos fractais se deu entre os anos de 1857 e 1913 quando alguns cientistas catalogavam alguns objetos que julgavam não ter valor científico na época e como tal eram denominados " demônios". Segundo Clemente (s.data), " a partir desse trabalho surge a ideia de fractal".
O fractal (do latim fractus, fração, quebrado) é uma figura com propriedades e características peculiares que o diferencia das figuras geométricas habituais.
O fractal pode ser dividido em partes, cada uma delas semelhante ao objeto original, como um todo.
Em muitos casos ele pode ser obtido por um processo iterativo ou recorrente.
                                                          Floco de Neve de Koch

Desta forma o fractal apresenta duas características muito frequentes, uma complexidade infinita, nunca poderemos representá-lo totalmente, pois sempre existirão reentrâncias e saliências cada vez menores repetindo um determinado padrão com ligeiras e constantes variações de si mesmo no seu interior, a autosimilaridade.
Como conseqüência dessa auto-similaridade, as diferentes partes de um fractal se mostram similares ao todo. Assim, os fractais têm cópias aproximadas de si em seu interior.
São muitas as definições de Fractal, mas podemos adotar a definição segundo J. Feder (1988), "um fractal é uma forma cujas partes se assemelham ao seu todo sob alguns aspectos".
O termo fractal foi utilizado pela primeira vez em 1967 por Bernoit Mandelbrot considerado o pai dos fractais. Quando estava preparando sua primeira obra importante sobre fractais para publicação em livro, Mandelbrot sentiu necessidade de encontrar um nome para a sua geometria. Começou a consultar um dicionário de latim do seu filho, onde encontrou o adjetivo fractus, do verbo frangere, que significa quebrar. Criou então a palavra fractal. [Monografia Fractais, pág 15]
Mas foi a partir dos anos 60, com o avanço científico e tecnológico, que surgem os primeiros fractais. Eles se dividem basicamente em duas categorias: os geométricos e os aleatórios.
A geometria fractal pode ser estudada em qualquer nível do ensino, pois pode-se partir da divisão de segmentos, fazer dobraduras para criar cartões, dividir figuras planas indefinidamente e colori-las nas aulas de artes ou usando recurso computacionais ou ainda, em um nível mais complexo, estudar entes matemáticos que envolvem modelagem, números complexos, entre outros.
Ou seja, os fractais podem ser usados para mostrar a conexão existente entre a Geometria e a Aritmética, dois ramos da Matemática.
Além disso, os fractais podem ser um dos meios para fazer a ligação entre a Matemática e a Natureza, entre a Matemática e as Artes.
Dessa forma, pretende-se mostrar a importância daquela que é a rainha das ciências e que costuma ser vista, pelos estudantes, como "o que bota terror".[Anais do XI Encontro Nacional de Educação Matemática - ISSN 2178-034X ]
Para a ligação com a matemática, é possível utilizar a construção da curva de Koch que começa com uma simples linha reta que é chamada de iniciador, onde seu terço médio é trocado por um triângulo eqüilátero do qual é retirado o segmento de sua base. A construção obtida, constituída por quatro segmentos, será copiada e reduzida, para ser reusada, sendo chamada de gerador.
O processo é repetido várias vezes, ou seja, pegar o terço médio de cada novo segmento gerado e trocá-lo por um triângulo eqüilátero sem base.

                                            

                                                       Construção da Curva de Koch

Com as artes podemos utilizar como exemplo o tapete de Sierpisnki que é construído cortando-se o nono central de um quadrado, cortando depois os centros dos oito quadrados mais pequenos que ficam, e assim por diante.
O análogo tridimensional é a esponja de Menger, uma rede aparentemente sólida com uma área de superfície infinita e volume nulo.
A esponja de Menger, cujo nome faz referência ao matemático que a inventou, o austríaco Karl Menger (1902-1985) é um dos fractais mais curiosos.
De acordo com Machado Neto (2004) podemos obter a esponja de Menger a partir de um cubo, dividindo-o  sucessivas vezes para a construção da esponja.


                                                  Blocos de formação da Esponja
Segundo Assis et al. (2008) o processo de construção se dá de tal forma que, para o nível 1, N = 0, tem-se  um cubo maciço de lado l e com volume V0 =l³. Para o nível 2, N = 1, o cubo é dividido em 27 cubos menores e iguais, cada um com uma aresta igual a l/3.
Remove-se o cubo central, bem como os seis cubos situados no meio de cada face do cubo maior.
Este processo é repetido sequencialmente com todos os cubos restantes, dividindo cada um em 27 outros com 1/3 da aresta do cubo imediatamente anterior. Similarmente, remove-se o cubo central e cada cubo na porção central das faces. No terceiro nível, ou seja, N = 2, cada um dos 20 cubos restantes são divididos em mais 27 cubos iguais, dos quais 7 são retirados, cada um com volume (l/9)³.
Assis et al. (2008) conclui que a Esponja de Menger possui volume nulo e uma área infinita na medida em que o número de níveis tende a infinito.
Neste caso o cálculo da dimensão fractal, pelo mesmo método usado anteriormente: D = - ln(n) / ln(r). Neste caso, segue que, n = 20 pois o número cubos aumenta 20 vezes de um nível para outro e o fator de semelhança entre esses cubos é r = 1/3, pois o comprimento da aresta de cada cubo é reduzido em cada nível à um terço. Temos então D ˜ 2,7268.
                                                  
                                                
                                              
                                              
                                                  Esponja de Menger, terceiro estágio.

Conforme Machado Neto (2004) o curioso na Esponja de Menger é que a cada estágio perde-se volume com a retirada de cubos e ganha-se área, pois vão aparecendo cada vez mais túneis. Façamos algumas contas para demonstrar, consideramos um cubo inicial de aresta a.
Após o primeiro estágio, a área da esponja é de
                                                                                  
; sabemos que a área total do cubo inicial é apenas 6a² , ou seja, a área aumentou.
O volume da esponja após o primeiro estágio, entretanto, é
                                                 
                                        
, menor que o volume inicial do cubo, que é  a³ , ou seja o volume diminui.
Desta forma a cada novo estágio a área aumenta enquanto o volume diminui cada vez mais.
Quando o número de estágios tende ao infinito, a área tende ao infinito e o volume tende a zero, ou seja a esponja de Menger é um objeto geométrico que tem volume zero e área infinita

A prática pedagógica utilizada atualmente no ensino da Matemática procura aproximar cada vez mais os fundamentos teóricos da realidade do aprendiz, correlacionando, para isso, conhecimentos empíricos a aspectos observados no mundo em que vivemos para construção do conhecimento.
Dentro desta perspectiva, trazer para a sala de aula atividades que ao mesmo tempo desenvolvam o raciocínio lógico-matemático e utilizem elementos do mundo concreto do aluno, satisfaz plenamente à expectativa que a metodologia aplicada impõe.
Reforçando a idéia de que alunos precisam experimentar a Matemática por caminhos diferentes do que aplicar algoritmos de papel e lápis a exercícios rotineiros, a Geometria Fractal vem permiti-los explorar os conceitos matemáticos trabalhando com as mãos, tanto na construção de modelos, quanto no desenho de quadros das consecutivas interações dos fractais clássicos.

Transcendendo as limitações impostas pela Matemática Clássica. Mandelbrot, em seu trabalho, ressaltou que os matemáticos foram, de certa forma, iludidos pela Natureza, que mostrou ter mais imaginação na diversidade de formas que apresenta.
A percepção de tais formas levou esses matemáticos a estudá-las sob os aspectos que Euclides não alcançou, tomando-se, assim, um estudo das "formas sem formas" ou "morfologias dos amorfos". Foi aceitando este desafio que Benoit Mandelbrot concebeu e desenvolveu esta Geometria da Natureza e implementou o seu uso em inúmeras aplicações.
A partir desta teoria descreveu vários dos irregulares e fragmentados modelos que encontramos em nossa volta através da família de formas que chamou fractais.[Partes do texto é baseado no artigo APRESENTANDO OS FRACTAIS E APLICAÇÕES EM SALA DE AULA - UNIOESTE - Campus de Foz do Iguaçu] 
Publicado na revista Scientific American, em 1985, o Fractal de Mandelbrot tornou-se famoso e sua imagem é encontrada em posters, camisetas, car tões postais, capa de CDs, etc. Sua construção utiliza um sistema de duas equações.

                                                   
O Fractal de Mandelbrot foi reconhecido como o mais complexo objeto da Matemática, “em seu interior, infinitas regiões podem ser observadas” (JANOS, 2008, p.87).

A dimensão dos fractais diferente do que acontece com a geometria Euclidiana, não é necessariamente uma quantidade inteira, é uma quantidade fracionária. A dimensão de um fractal representa o grau de ocupação deste no espaço que tem a ver com seu grau de irregularidade, a estrutura e o comportamento, quer se trate de uma figura ou de um fenômeno físico, biológico ou social, em 1919, Felix Hausdorff (1868 - 1942) estendeu esta noção de dimensão de similaridade para que ela se aplicasse a todo tipo de formas, além das formas auto-similares, por isso a dimensão fractal é chamada também de dimensão Hausdorff .
Uma curva irregular tem dimensão entre um e dois, enquanto uma superfície irregular tem dimensões entre dois e três.
                                                                
                                   Comparação entre a dimensão Euclidiana e a dimensão fractal.
                                                             (SIQUEIRA, 2005)
Conforme Backers e Bruno (2005) a dimensão fractal de objetos geométricos pode ser calculada usando a fórmula

                                                                                            
, onde N é o número de segmentos que substituíram o segmento original, e L é o tamanho do segmento substituído.
Esta formula pode ser usada para o calculo das dimensões de varias figuras, como exemplo a dimensão da esponja de Menger, no primeiro estágio da construção da esponja 7 dos 27 cubinhos são retirados, portanto restam 20 cubos cujas arestas medem 1 / 3 da aresta original, portanto é
                                            
                                                    
que é 2,72 aproximadamente.

Esta fórmula, utilizada para calcular a dimensão fractal, pode ser facilmente demonstrada através de um método chamado de contagem de caixas, que consiste em cobrir uma figura com caixas cada vez menores como mostraremos a seguir.
A demonstração deste método de contagem de caixas, será apresentada a seguir conforme o proposto Xavier (2007).
Quando uma reta é coberta por caixas cada vez menores é possível estabelecer uma relação entre o número de caixas e o tamanho de cada uma delas.

                      

                                                       Reta coberta por caixas

Na figura 13 A, observamos que uma caixa de comprimento 1 cobre o quadrado, já a figura 13 B quatro caixas de comprimento 1 / 2  em relação a caixa inicial passam a cobrir o quadrado, por último a figura 13 C mostra que nove caixas de comprimento
1 / 3 , passam a cobrir o quadrado.

Desta forma podemos concluir que N = L -¹ lembrando que a figura possui dimensão de espaço 1.


Fractais na natureza

Conforme Stewart (1996) as formas encontradas nos animais e plantas chamam a atenção dos matemáticos, por exemplo, muitas conchas formam espirais, as estrelas do mar possuem um conjunto simétrico de braços, alguns vírus adotam formas geométricas regulares. Mas além dos padrões de forma, existem os padrões de movimento, como o andar humano, os pés tocam o solo num ritmo regular, esquerda-direita, ou a sidewinder, uma cobra do deserto que se move como uma espiral de
                                        
                                                              sidewinder
uma mola helicoidal, jogando seu corpo para frente em forma de curvas tentando minimizar seu contato com a areia quente.
Mas a simetria da natureza é também muitas vezes imperfeita, existindo outra categoria de padrões naturais, padrões que existem onde pensávamos que tudo era aleatório e sem forma, estes padrões são chamados de fractais.
"Os fractais podem ser encontrados em todo o universo natural e em toda a ciência, desde o aspecto das nuvens, montanhas, árvores e relâmpagos, até à distribuição das galáxias, assim como na arte e na matemática" (SANTOS; OLIVEIRA, 2004).
Os fractais naturais estão à nossa volta, basta observarmos as nuvens, as montanhas, os rios e seus afluentes, os sistemas de vasos sanguíneos, etc.
Estes objetos foram realmente estudados a fundo no século XX.
Entretanto,  objetos da natureza não são verdadeiramente fractais, pois não são infinitamente complexos. Os objetos naturais podem exibir uma estrutura semelhante ao fractal, porém com uma estrutura de tamanho limitado

Geometria fractal

Conforme Fractal (2006) a geometria fractal é o ramo da Matemática que estuda as propriedades e comportamento dos fractais. Descreve muitas situações que não podem ser explicadas facilmente pela geometria clássica, e foram aplicadas em ciência, tecnologia e arte gerada por computador.
Os conceitos dos fractais surgiram através de tentativas de medir o tamanho de objetos para os quais as definições tradicionais baseadas na geometria euclidiana falham.
Características dos Fractais
Um fractal é definido por três características básicas, a autossimilaridade, a complexidade infinita (iteração) e a dimensão fracionária.
Autossimilaridade
Segundo Carvalho (2005) autossimilaridade ou autossemelhança é a mais elementar e marcante das características dos fractais, significa que cada par te em escala menor é exatamente igual ou semelhante à par te inicial, isto é, cada par te ampliada da imagem será igual a da inicial.
Autossimilaridade é que seus padrões característicos são repetidamente encontrados em escala descendente, de modo que suas par tes, em escalas menores, em qualquer escala, são, na forma, semelhantes ao todo (CAPRA,1996, p. 118).
Existem dois tipos de autossemelhança: exata e a aproximada ou estatística.
Ainda segundo (CAPRA, 1996), a autossemelhança exata significa que, mesmo ampliado várias vezes, cada par te é idêntica à original, não impor tando quantas ampliações forem efetuadas.
A autossemelhança aproximada ou estatística significa que o objeto ampliado várias vezes não será igual ao inicial, será apenas semelhante. O fractal possui medidas numéricas ou estatísticas que são preservadas em diferentes escalas.
Os fractais que apresentam a característica da autossemelhança exata são aqueles construídos a partir de figuras geométricas, os chamados Fractais Geométricos, como:
Curva de Koch, Triângulo de Sierpinski...
Enquanto que, os fractais encontrados na natureza, os Fractais Naturais - couve-flor, gengibre, nuvens, entre outros – apresentam uma autossemelhança estatística, pois as par tes são semelhantes em média ao todo, isto é, as partes em escalas menores são apenas parecidas com o todo.
Pelo exposto ao final do texto sobre a teoria do caos, os fractais possuem uma trajetória diversa desta teoria, porém, não obstante, que seja a ela relacionada por apresentar algumas similaridades com os sistemas de equações não lineares, e portanto, que a relação seja mantida.
"[...]. São as estruturas quebradas, complexas, estranhas e belas desta geometria, que conferem uma certa ordem ao caos, e esta é muitas vezes caracterizada como sendo a linguagem do caos" (SANTOS; OLIVEIRA, 2004).
Conforme Rezende e Versignassi (2006) por ela explicar coisas infinitamente complexas, passou a fazer parte desta nova ciência, a Teoria do Caos que iniciou o assunto da postagem.

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