sábado, 22 de março de 2014

Sinestesia - A sensação simultânea

              
                                                 

Algumas pessoas conseguem ter a percepção de vários sentidos de uma só vez. Elas são capazes de sentir as cores, o paladar das formas, o cheiro das texturas, a personalidade dos dias da semana. Como isso seria possível? 
A partir da sinestesia - termo cunhado nos anos 1890, provém de Francis Galton em seu classico livro Inquiries into human faculty and its developement, publicado em 1883  - Sinestesia é uma palavra que vem do grego synaísthesis, onde syn significa "união" e esthesia significa "sensação", assim, uma possível tradução literal seria "sensação simultânea". a sinestesia é uma condição neurológica que provoca a mistura dos sentidos e que costuma ter causa genética.

Segundo SANZ (apud GOMES, 1999), em nível fisiológico, sinestesia é a sensação secundária ou associada produzida em um ponto do corpo humano, como conseqüência de um estímulo aplicado em outro ponto diferente.
Em nível psicológico, são imagens ou sensações subjetivas características de um sentido que surgem determinadas pela sensação própria de um sentido diferente.

No quarto século antes da Era Cristã, Aristóteles (384-322 a.C.) já havia escrito sobre os cinco sentidos, os quais, ainda hoje, são considerados como os sentidos tradicionais: visão, audição, tato, olfato e paladar.
A visão se configura a partir da percepção que olhos têm da luz, que é parte radiação magnética de que estamos rodeados.

O tato e a audição se constituem a partir de fenômenos que dependem de deformações mecânicas, portanto são sentidos mecânicos. Por último, temos o olfato e o paladar que são sentidos químicos, pois as informações chegam até nós por meio de moléculas químicas que se desprendem das substâncias.

Nas últimas décadas, o avanço das ciências neurocognitivas e das pesquisas sobre o cérebro e a consciência, amparadas em novas tecnologias como a ressonância magnética
 funcional fRMI, Espectroscopia no infravermelho próximo (NIRS) e tomografia óptica de difusão (DOT- Diffuse Optical Tomography, ) são técnicas emergentes cada vez mais empregadas para o mapeamento funcional do cérebro, tornaram possível observar processos 

                    
                                


cerebrais antes inacessíveis, gerando uma nova onda de interesse pela sinestesia e por aquilo ela pode revelar sobre a cognição.

Os estudos neurológicos permitem afirmar que o estado de percepção sinestésico, ou ao menos um estado mais intenso de intercruzamento modal, é característico da infância.

A sinestesia é uma propriedade natural do sistema perceptivo dos recém nascidos e é mais facilmente encontrada nas crianças.

Mais que isso, o estado de preenchimento pela sensação, ou abandono à sensação (como oposta à razão), pode ser relacionado a um modo cognitivo da infância, onde o aqui-agora da sensação predomina sobre o universo simbólico, duradouro, característico da cognição verbal.

Nossa ‘conversão’ crescente ao universo mais ‘flexível’, prático, racional e eficiente do simbólico coloca palavras entre nós e o mundo.

De acordo com Santaella (2005, p.74), o olho, que capta energia radiante, é o sentido que mais longe vai na sua exploração panorâmica até o horizonte.

O ouvido, que capta energia mecânica vibratória, não atinge as mesmas distâncias que o olho.
O tato interage no corpo-a-corpo com as coisas, toca, apalpa, tropeça.

                            

O olfato capta energia química numa troca de partículas que chegam pelo ar. No paladar essa troca de partículas se dá no próprio corpo.

                                 

É pelo corpo que o homem participa do mundo e apreende uma realidade. De acordo com Rector e Trinta (2005, p.35), o ser humano consegue perceber o mundo, recortá-lo segundo um modelo, absorvê-lo e transformá-lo em cultura através de seu próprio corpo e dos meios de que este dispõe para efetuar tal função.
Tendo para isto, instrumentos fornecidos pela natureza que o capacita para essas interações com o ambiente que o circunda.
Estes instrumentos privilegiados são os cinco sentidos: a visão, a audição, o tato, o paladar, o olfato como já mencionado. 
Estes sentidos estão condicionados por dois outros fatores: espaço e tempo. Os sentidos, aliados a estas duas dimensões, são o instrumental de que o homem dispõe para apreensão, compreensão e desenvolvimento intelectual do universo no qual está inserido. 

Rector e Trinta (2005, p.34) nos lembram que os olhos, os ouvidos e o nariz configuram-se como receptores a distância, enquanto o tato e as sensações recebidas através da pele, membranas e músculos são receptores imediatos3. No entanto, a pele também pode ser considerada como um receptor a distância, uma vez que somos capazes de sentirmos arrepios, ou seja, ter a textura da superfície da pele alterada, sem um contato físico muito próximo.
Santaella (2005, p.73) afirma que embora os sentidos se misturem entre si, especialmente há muitas misturas dos outros sentidos com o tato, "não se pode negar a evidência de uma hierarquia entre os sentidos, hierarquia que tem suas bases já em mecanismos físicos, químicos e fisiológicos". Para a autora, há uma nítida gradação de complexidade que segue a seguinte ordem decrescente: (1) visão; (2) audição; (3) tato; (4) olfato; e (5) paladar.

Há evidentemente uma gradação que vai do olhar ao degustar, o olhar e a escuta sendo mais mediatizados e o apalpar, cheirar e degustar, estando numa escala decrescente de mediação até a quase imediatez que é o caso do degustar.
Enquanto a percepção visual e a sonora são processos nítidos de decodificação, o apalpar já implica uma interação com a matéria, enquanto o cheiro e o paladar envolvem uma absorção da matéria pelos nossos órgãos sensores. O que é comum a todos eles, no entanto, é o fato de que há algum processo interpretativo por parte do sujeito perceptor, o que os caracteriza a todos, em menor ou maior gradação, como processos de linguagem (SANTAELLA, 1996, p.314).

A visão e a audição são os mais complexos, pois o olho e o ouvido mantêm uma grande intimidade com cérebro. Depois o tato, sentido que tem um nível de complexidade mediano, pois os nervos da pele não se ligam diretamente ao sistema nervoso central, mas se distribuem por todo nosso corpo.

Por fim, o olfato e o paladar podem ser considerados os menos complexos, pois reagem aos estímulos químicos, enquanto os demais sentidos reagem aos estímulos físicos.
Ainda sobre a hierarquia dos sentidos, Santaella (2005, p.74) postula:

 A comparação da intimidade do olho com os interiores do cérebro e da intimidade do paladar com os interiores do corpo fala por si sobre a hierarquia dos sentidos, que tem o tato, órgão não só sensório, mas também motor, em situação central, entre os dois buracos para o cérebro, olho e ouvido, e os dois buracos para o corpo, o olfato e o paladar, estes mais "matéricos", pois reagem a substâncias químicas.

Hall (1979, p.50, apud PLAZA, 2003, p56) afirma existir uma relação entre a era evolucionária do sistema receptor humano e a quantidade e qualidade de informação que se transmite para o sistema nervoso central. O autor afirma que os sistemas táteis, ou do tato, são tão velhos quanto a própria vida; na verdade, a capacidade para reagir a estímulos é um dos critérios básicos da vida. A vista foi o último e mais especializado sentido que se desenvolveu no homem. A visão tornou-se mais importante e o olfato menos essencial quando os ancestrais do homem saíram do chão e passaram às árvores.


De acordo com Santaella (1998, p.12-13), o olho e o ouvido se constituem em aparelhos biológicos especializados e não são apenas canais para a transmissão de informação, mas são órgãos codificadores e decodificadores,

                          


"de modo que parte da tarefa que seria de responsabilidade do cérebro já começaria a ser realizada dentro desses órgãos, para ser completada no cérebro". Já os outros órgãos, possuem conexões mais indiretas com o cérebro, pois estariam ligados aos apetites físicos. 
De acordo com Plaza (2003, p.46), "muito mais do que o real, o que os nossos sentidos captam é o choque das forças físicas com os receptores sensoriais".

Os Sentidos

Vale, portanto, lembrarmos as seguintes palavras de Plaza (2003, p.46):
A palavra "sentidos" é tão enganosa quanto o conceito de "sensação", pois não existem sentidos departamentalizados, mas sinestesia como inter-relação de todos os sentidos. A sinestesia, como sensibilidade integrada ao movimento e inter-relação dos sentidos, garante-nos a apreensão do real.


Os sentidos são dispositivos para interação com o mundo externo. Segundo Santaella (2005, p.70), "os sentidos são sensores cujo desígnio é perceber, de modo preciso, cada tipo distinto de informação".
De acordo com Braun (1991, apud SANTAELLA, 2005, p.70), são pelo menos três as facetas que configuram o processo por meio do qual sentimos algo: (1) A recepção de um sinal externo que excita um órgão correspondente dos sentidos;
(2) A transformação dessa informação em um sinal nervoso;
(3) O transporte desse sinal e a modificação que ele sofre até chegar ao cérebro e nos dar a sensação de haver sentido algo.

Portanto, para que possamos sentir algo, é fundamental o papel exercido pelos órgãos dos sentidos, os quais atuam como transdutores, ou seja, transformadores de sinais físico-químicos em sinais elétricos que são transmitidos por nossos nervos.
Obviamente, o cérebro exerce um papel fundamental dentro deste processo de percepção.
Assim, por meio de mecanismos físico-químicos, as informações que chegam até nós são transformadas em sinais nervosos, os quais são recebidos por nosso cérebro e decodificados, de acordo com a nossa concepção individual do mundo.
Então, não é exagero disser que é pelo corpo que o homem participa do mundo e apreende uma realidade. 
Assim, conforme Rector e Trinta (2005, p.35), o ser humano consegue perceber o mundo, recortá-lo segundo um  modelo, absorvê-lo e transformá-lo em cultura através de seu próprio corpo e dos meios de que este dispõe para efetuar tal função. 

 Sinestesia cromática

A cor sendo um estímulo visual, pode evocar associações com percepções naturais de outros sentidos. A partir do conhecimento desta capacidade da cor é possível utilizá-la como uma ferramenta de transformação dos ambientes.
                       
Estes podem ser modificados tornando-se, por exemplo, maiores ou
menores, mais baixos, mais altos ou mais  estreitos, entre outros, apenas com o efeito da cor. Para MAHNKE (1996), estas associações são muito reais e têm um papel importante no design de ambientes.
A sinestesia cromática pode surgir proveniente de imagens visuais, olfativas, gustativas, táteis, acústicas, dinâmicas (movimento e latência) e temporais.

Percepção visual:

A cor interfere na apreciação da forma, espaço ou volume, tamanho e peso. Percepção da forma: O valor da cor está intimamente ligado à sensação da forma, realçando-a ou atenuando-a.
                        
De modo geral, cores mais "agudas" sugerem formas pontiagudas, sendo um exemplo o amarelo e ao triângulo.
As cores designadas de "profundas", como o azul, fazem associação com o círculo.
Percepção de espaço ou volume: A luminosidade da cor é um importante fator para a percepção da amplitude ou redução do espaço ou volume. Superfícies de cores claras ou pálidas, frias ou com padrões pequenos

                              

distanciam-se do observador, causando a sensação de um maior volume do ambiente.
                       

Por outro lado, superfícies com cores escuras, saturadas ou com padrões grandes, fecham o espaço, diminuindo o interior.
O nível de luminância interfere neste aspecto. Quando alto, evidencia maior volume, quando baixo inibe esta sensação.
Percepção de tamanho: Cores quentes fazem foco em pontos atrás da retina e as frias diante da mesma.
Para perceber as cores quentes, o cristalino torna-se convexo, enxergando estas cores com uma extensão maior do que a real; ao contrário, para

                                
perceber as cores frias, torna-se côncavo, o que faz com que estas cores pareçam ter uma extensão mais reduzida.
Percepção de peso: O branco, as cores quentes e claras, menos saturadas (pastel), produzem a sensação de menor peso e maior sutileza, enquanto que o preto, as cores frias e escuras sugerem maior peso e solidez.
Percepção de movimento e latência: Cores quentes são projetantes ou salientes, gerando a sensação de proximidade e cores frias são retrocedentes, afastando-se do observador, criando sensação de distância e profundidade. 
Este efeito é facilmente percebido quando as cores projetantes e retrocedentes estão superpostas em um mesmo plano. Isto se deve a latência ou retardo de captação do estímulo cromático pelo olho, devido ao processo de acomodação, que difere segundo o comprimento de onda. 
O azul e o vermelho parecem se mover ou flutuar quando são vistos juntos.

           
Este mesmo efeito ocorre com outros pares de cores, como por exemplo, o cyan e o laranja, o vermelho e o verde.
Estas combinações parecem oscilar quando os dois matizes apresentam a mesma saturação e luminosidade.
Apenas o amarelo e o púrpura parecem manter suas posições no espaço.
Percepção temporal:
A cor aparentemente influencia o julgamento do tempo.
Experiências mostraram que, em ambientes com cores quentes, o ser humano subestima a passagem do tempo e em ambientes com cores frias o tempo é superestimado.
Percepção tátil:
A sensação tátil é produzida pela diferença no tom das cores, entre os tons quentes e tons frios.
Cores quentes parecem fofas e macias, enquanto cores frias causam a sensação de serem duras e secas.
Algumas cores parecem rugosas e ofendem a vista.
Outras, causam impressão de serem lisas, aveludadas, como por exemplo, o azul-ultramar escuro, o verde-cromo, a laca vermelha.
Percepção de temperatura:
O calor ou frieza de uma cor demonstra sua tendência geral para o amarelo ou para o azul, respectivamente.

         
Além da associação por imagens mentais arquivadas, pesquisadores comprovaram que receptores das palmas das mãos podem perceber a diferença entre a quantidade de calor refletida por uma superfície vermelha e uma superfície azul de um objeto.
Alguns experimentos constataram a diferença de 4 a 5 graus em sensações subjetivas de calor e frio, em ambientes pintados de azul e vermelho.
Percepção auditiva:
Pesquisas realizadas por psicólogos da Gestalt chegaram a conclusão de que sons altos e fortes fazem com que os olhos fiquem mais sensíveis ao verde e menos sensível ao vermelho.
Os sons agudos, de alta intensidade e estridentes, tendem a ser comparados com os matizes quentes, brilhantes e saturados e, em oposição, sons graves e abafados são comparados com os matizes frios, menos luminosos e de baixa saturação. Estas associações são úteis para compensar, visualmente, o problema de ruídos em diversos tipos de ambientes.

 PAPEL FUNCIONAL DAS CORES

Em relação ao papel funcional das cores, HAYTEN (1958) considera que a aplicação funcional das cores consiste na utilização destas segundo o propósito de satisfazer as necessidades de eficiência e conforto, que estão diretamente relacionadas ao desempenho do trabalho e à segurança do trabalhador.
E complementa que o uso de cores com o objetivo funcional atua à margem de qualquer convenção estética ou preferência pessoal.
Os aspectos funcionais das cores e a forma como eles podem ser trabalhados para a obtenção de ambientes de trabalho mais agradáveis e adequados às características das tarefas e de seus usuários, é abordado por FONSECA, 2004.

                     

Alguns endereços de vídeos sobre sinestesia:

www.youtube.com/watch?v=rl-UWR_3N9A
vimeo.com/25076605
               

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